quinta-feira, 25 de outubro de 2012

A leitura e eu


Josca Ailine Baroukh*

Leitura é meu mantra, a ordem do dia, de todos os dias, em minha atuação junto aos educadores, seja de escolas públicas, privadas, ou de organizações não governamentais. Estendo esse mantra a todas as faixas etárias, desde os bebês de um ano às meninas e meninos do final do Ensino fundamental. Quando atuei na formação inicial de professores, era também a menina dos meus olhos.

Para escrever este texto, parei para pensar nisso. Por quê? Por que a leitura é tão importante para mim? Seja como educadora, seja fora dos momentos de trabalho. Os livros me acompanham, são grandes amigos, estão sempre por perto. Gasto mais do que devo para tê-los próximos. E os critérios de escolha são bem diversos! Gosto dos bonitos, vistosos! Gosto dos pequenos, calorosos... Gosto dos temas, das capas, dos autores, dos cheiros, das cores, do papel, enfim... Gosto dos livros.

Gosto e, como diz Marta Pinto Ferraz, minha amiga, eu vendo leituras. Vendo a quem tiver interesse. Vou conversando, ouvindo a pessoa e, de repente, surge uma indicação na ponta da língua: “Eu acho que você iria gostar muito de ler este livro! Me lembrei dele enquanto falávamos...”. E assim, vou apresentando personagens, tramas.

Voltando ao por que, remeto-me à minha infância. Vivi um tanto isolada, por necessidade de tratamentos de saúde, e desde muito cedo os livros me foram apresentados por minha mãe. No início, como leitora, ela me introduziu ao prazer de conhecer novas pessoas, outros modos de ser. Mais tarde, quando aprendi a ler sozinha, nunca mais estive só!

Eles estavam sempre por perto: os clássicos do século XIX, que minha mãe trazia, os quadrinhos, como Asterix e Timtim, a literatura brasileira, indicada pela escola, os autores proibidos, e aqueles que eu não conseguia entender (aos quais voltaria mais adiante). Um pouco mais tarde, chegaram os informativos.

Ah! Quando queria saber algo sobre assunto desconhecido, era à livraria que me dirigia. Este era um gasto que meu pai não regulava (da mesma forma que eu faço hoje, com meus filhos). Assim, quando resolvi estudar Psicologia, comprei algumas obras de Freud, e me pus a ler. Difícil de entender, bati a cabeça durante vários dias. Tive que procurar ajuda, ler resumos. Deixei os livros descansando e os retomei na faculdade. Aí, sim! Eles fizeram todo o sentido!

Livros são janelas, são portais para outras dimensões, para acessar outras formas de pensar, agir e sentir.Os personagens nos encantam, emocionam, ou despertam imenso ódio e raiva. Os autores apresentam novas e inéditas tramas, com seus modos peculiares de escrever. Gosto de ler vários livros do mesmo autor. Sinto como se ficasse mais próxima, como se o conhecesse. É como se eu estivesse compartilhando sua maneira de ver o mundo, de pensar, de resolver sua estadia por aqui.

* Coordenadora da coleção de livros "Interações: onde está a arte na infância?", publicada pela Editora Blucher em 2012.

sábado, 6 de outubro de 2012

Por que contar histórias?

Edi Fonseca, contadora de histórias, publicou em 2012, pela Editora Blucher, o livro "Interações: com olhos de ler – apontamentos sobre a leitura para a prática do professor de Educação Infantil". O texto abaixo foi extraído da obra. Nas fotos, a autora em ação.


Antes, muito antes de existir a escrita, os livros e a escola, já se contavam histórias. O ato de narrar oralmente é uma ação dos tempos mais remotos, que aconteceu em diferentes culturas, lugares e épocas.  Ainda hoje narramos ao contarmos um fato que nos aconteceu no dia, um sonho, uma piada, uma história de família, um episódio triste, um momento de realização e alegria, a descrição de uma conquista... Trata-se do momento em que duas ou mais pessoas se reúnem para contar algo por meio de palavras, gestos, ritmos, expressões, olhares e silêncios. A narração oral não é um ato individual. Não é algo que se faz sozinho. E aí temos uma primeira resposta para a nossa pergunta. Narrar oralmente é uma ação que acontece quando se quer partilhar algo com alguém. “Vou te contar uma história”, “Escuta essa”, “Você não vai acreditar no que aconteceu comigo”, “Essa é boa, lá vai”,  “Certa vez”, “Quando eu era criança”, “Na época da minha avó”, “De onde meus pais vieram”, “Há muito tempo”, “Você sabe da última?” “Era uma vez...” Frases muito conhecidas por nós. Em todas essas situações há a necessidade da presença de alguém que conta e de alguém que ouve a história.
“(...) a atividade de contar histórias constitui-se numa experiência de relacionamento humano que tem uma qualidade única, insubstituível.” (MACHADO, p. 33, 2004)
Talvez seja por isso que não só as crianças, mas os próprios adultos pedem para ouvir histórias e muitas vezes as mesmas. Quando nos reunimos nos encontros de família, sempre surgem aqueles momentos que alguém relembra algo que aconteceu ou quer contar aquela mesma piada, aquele mesmo causo. Pedimos e ouvimos a história já conhecida. Divertimos-nos ou nos emocionamos novamente com ela e ainda mais porque podemos antecipá-la. Observamos quem está em volta de nós se divertindo ou se emocionando junto conosco. Aquela história nos pertence ou pertencemos a ela. E isso tudo está ligado ao lúdico, à tradição e ao afeto – uma segunda resposta para nossa pergunta inicial.
É assim que acontece com a criança. Tem suas histórias preferidas e pede: Conte aquela história da bruxa! Conte de novo como foi o dia em que eu nasci! E pensamos: Mas de novo? Sim! Porque de novo poderemos ficar juntos, nos divertir, nos emocionar, sentir medo. E talvez possamos dar muitas risadas ou sintamos um frio na barriga. Talvez escutemos barulhos dos seres assustadores ou simplesmente um silêncio enorme cairá sobre nós. Porque de novo vou ouvir sua voz, observar seus gestos e expressões e olhar nos seus olhos. De novo viajaremos juntos por cenários conhecidos ou novos. De novo ficaremos perto, num momento de intimidade e de cumplicidade. Vamos, conte-nos novamente uma história e nos leve daqui, para o passado, para o futuro, para o mundo imaginário onde tudo pode acontecer.